segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Hoje é domingo, pé de cachimbo e o sentido da vida


O domingo que era sexta-feira

Vejo daqui a chuva descendo pela janela do ônibus. Seria eu capaz de fitá-la por mais alguns minutos sem pensar inevitavelmente que hoje é domingo? E hoje é domingo, pé de cachimbo. Assim já diziam meus avós a mim e a minha prima, quando ainda eramos pequeninas...Mas naquela época, os domingos ainda eram sextas-feiras. Até que, alguns anos depois – ou, muitos anos depois - o domingo virou domingo, ganhando a sua devida proporção. Ruim? Não, diria até que necessário.

O domingo que virou domingo

Necessário porque os contrastes fazem parte do entendimento do sentido da vida. Como entender a escuridão se nunca se experimentou a claridade de um dia ensolarado? Sim, que seria do claro sem o escuro? E do escuro sem o claro? Eles não seriam o que são, não teriam o sentido e valor que têm. Como entender o poder imenso que a felicidade nos traz se não passarmos por períodos em que somos tomados pela tristeza, pequena ou grande, não importa. Tristeza é tristeza. E quem já sentiu sabe, e pronto. Qual seria a alegria então de apreciar um doce se não existisse o amargo? Qual seria a graça de esperar um sol bem bonito se não existisse aqueles dias – ou esses dias – nublados e chuvosos. E vice-versa. O frio também não teria graça sem o calor. Ah, nada como esperar o inverno chegar pra ficar embaixo do cobertor bem quentinho. E depois, nada como esperar o verão chegar simplesmente para sentir o sol batendo na pele e olhar para o azul do céu. Nenhuma das coisas simples da vida teria graça sem a riqueza dos opostos.

A ausência do oposto e a escolha

Porque um oposto, na verdade, complementa o outro, e desenvolve a percepção da ausência. A compreensão individual da ausência começa com a escolha diária, com a qual, ou com as quais nos deparamos. Desde o momento em que a gente acorda até o momento de ir dormir, são incontáveis o número de escolhas. Nescau gelado pra acordar ou quentinho pro chocolate derreter? Café com leite ou só café ou só leite? Calça ou vestido? Almoço aqui ou lá? Digo isso ou aquilo? Será que se disser assim, vou parecer rude? Ou será que se não disser assim, vou parecer benevolente demais? É tudo uma questão de momento misturado com a ocasião: escolha, opção, e como é difícil escolher...Principalmente porque uma escolha resulta em uma renúncia. E aí entra a compreensão de cada um acerca da ausência que daquela escolha implica.

Uma tentativa de encontro do sentido da vida

Será que um olhar sobre o sentido da vida está na observância dos opostos? Será que o sentido de tudo isso tem um segredo? Se tiver, o segredo é completamente individual, e aí reside o grande desafio: descobrir qual é o seu segredo pra desvendar o sentido particular da existência. O sentido de você gostar tanto de estudar aquele tema. Ou simplesmente o sentido de você não gostar de estudar. O sentido de você querer se envolver em calorosas discussões que, muitas vezes, te tiram do sério. O sentido da preguiça. Do amor. Da paixão desenfreada que te deixa bobo e cego. E olha que isso acontece. O sentido de você querer tanto aquela pessoa que te tira dos eixos. O sentido de você admirar tanto uma pessoa e o sentido de você não admirar nada outra pessoa. O sentido naquelas ações impensadas. O sentido de ficar tanto tempo com uma pessoa que não tinha e nunca teve nada a ver com você só pra não ficar só (e quem disse que já não se estava só)? Que sentido é esse? Ou, que perda de sentido foi essa? O que um dia já fez sentido e não faz mais. E o que nunca fez sentido. Sim, porque o sentido quem dá é cada um.

Logoterapia

Tem até uma linha terapêutica que tenta compreender o paciente e observar seus valores pelo sentido que ele atribui as coisas que o rodeiam. Trata-se da logoterapia, desenvolvida pelo psiquiatra Viktor Frankl, durante o tempo que ele permaneceu em um campo de concentração. No livro por ele escrito, “Em busca de sentido”, ele relata a aplicação desse método no campo de concentração, muitas vezes questionando essas pessoas sobre o que fazia com que elas permanecessem vivas mesmo sem perspectiva alguma de nada, onde elas buscavam sentido pra isso. E com a coleta de depoimentos, ele foi percebendo que cada uma delas buscava sentido em algo de muito representativo para elas, muito importante em algum momento de suas vidas, seja uma lembrança de um momento, sejam pessoas ou situações. E, por meio da terapia, ele fazia com que elas, relembrassem, de alguma forma, o que fazia sentido pra elas na vida, o que fazia com que elas permanecessem vivas naquela situação. E assim, fazia com que cada um relembrasse, dentro de si, o sentido para a vida delas.

Um dos segredos, talvez...

Observar os opostos, a ausência de um deles enquanto o outro está presente é uma das muitas maneiras em se achar um sentido nas nossas ações e nos sentimentos. Porque, afinal, qual seria o sentido da tão comemorada sexta sem a melancolia da segunda e do vazio do domingo?
Sabendo, portanto, que os opostos se intercalam e coexistem, por que não vivenciar um belo dia aparentemente apático do exercício do nada e dizer: ok, hoje é domingo...(e pé de cachimbo....)
E você, já pensou no que faz sentido na sua vida, o que te move, o que te faz querer fazer cada vez mais?

Um comentário:

  1. Os celtas e os orientais diriam que sim. O sentido da vida está no equilíbrio dos opostos...

    Passando para deixar um "oi"! Ótimo pensamento!

    Abração!

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