Olá queridos leitores!
Putz, faz um tempo que queria falar dessa São Paulo que conheço e que me acolhe desde 1982. E que, aliás, a todos acolhe.
Para aqueles que moram, já moraram ou ainda vão morar em São
Paulo, vai ser bem fácil visualizar o que tento falar, do sentimento comum às pessoas que
moram nas cidades grandes e, especialmente, nessa cidade.
Um sentimento muitas vezes – e na maior parte das vezes –
dúbio.
Uma vontade às vezes de querer fazer tudo, todos os cursos
gratuitos e não gratuitos, ir a todas as exposições em cartaz, gratuitas e não
gratuitas, a todos os shows de domingo no Ibirapuera, conhecer o mais novo
restaurante, e o não tão novo, mas tradicional, de conhecer o mais novo
barzinho, e a não tão novo assim, mas aquele que a gente sempre acaba quando
não sabe pra onde ir ou até mesmo pra terminar a noite.
Mas, de repente, uma vontade de não fazer nada atinge a
gente, uma priguicite aguda (como diria meu pai!) acumulada da semana que te
deixa paralisado, preso no “apertamento”, ou na casa, tanto faz, preso do mesmo
jeito a gente fica. Preso pela preguiça e pelo receio de sair de casa e saber
que não será nenhuma novidade você pegar trânsito no domingo, ter que rezar
para o flanelinha não rabiscar o seu carro se você não der os R$ 20,00
adiantados que ele pede. E você paga. E dói. Mas é o preço que se paga para
viver aqui.
Mas tem uma coisa me atrai nessa cidade: o poder que qualquer
um tem de ser tudo e não ser nada. E ela me deixa ser tudo e não ser nada. Me
deixa brilhar nos palquinhos de karaokê espalhados pela cidade e ter meus
minutinhos de fama (!), e que permite igualmente ser mais uma anônima nas ruas
de São Paulo, seja entre os ricos e novos ricos que circulam pela Oscar Freire,
seja andando por entre as ruas estreitas da Vila Brasilândia, ou até mesmo
pelas ruas de nome estranho de São Matheus ou então caminhando na Avenida
Paulista, do começo até o fim, do fim até o começo. Nos dias frios e nos dias
de verão.
E por causa disso e de muitos mais issos, eu gosto e
desgosto dessa cidade. Eu, ao mesmo tempo que amo, odeio. Ao mesmo tempo em que
tudo, de uma hora pra outra alaga e um monte de gente morre, eu juro pra mim
mesma que vou mudar daqui, eu me encanto com a riqueza de cada pessoa que
conheço, já conheci e ainda vou conhecer por aqui...e com o charme do Teatro Municipal
todo iluminado à noite, da boemia da Vila Madalena e da agitação da Vila Olímpia.
E do silêncio daquela rua do Carrão.
E por tudo isso, escrevi algumas linhas sobre São Paulo, ou
Sampa, para os mais chegados, e posto uma música do Criolo ("Não existe amor em SP"), que acho a cara de
São Paulo (Sim, eu sei que “Sampa”, de Caetano, é linda e poética e romântica,
mas acredito que essa composição do Criolo demonstra
bem a solidão das grandes cidades, em cada muro grafitado, em cada canto, em todos os cantos).
“Mais amor por favor”
Luzes iluminam a cidade.
De faces diversas, sofridas, confusas, cansadas.
Apaixonadas, perdidas, apressadas, desiludidas, sozinhas.
Sonhadoras.
“Mais amor por favor” – grita o grafite espalhado por São
Paulo
O homem, com um bíblia na mão, fala para quem quiser ouvir,
no meio da Praça da Sé.
E a ele se misturam muitos outros homens de passos apressados, esbarrão, papéis
rabiscados, no chão.
Família cabisbaixa adentra o Forum João Mendes.
Sonho de justiça.
Disparam sirenes na Avenida Paulista.
E a ela se funde o barulho.
Das buzinas das motos, dos carros, dos ônibus.
O político angariando voto, o alto-falante anunciando.
E não tão longe dali, o homem, segurando uma, duas, três
placas, ainda tem força para gritar: “Ótica, ótica, ótica!”
E o barulho da chuva é o que menos se percebe aqui, ali,
acolá.
A natureza do asfalto nos engole o tempo, a dor, a fome, o
amor, a pobreza, a riqueza, o amargo rancor.
E os muros insistem: “Mais amor por favor”
Ando pela Paulista, esbarrões me fazem mudar de rumo.
A calçada está cheia, as pessoas, vazias. Olhar vazio.
Tento um "oi" com os olhos, mas tudo e todos parecem absorvidos pelo cinza do asfalto.
E os muros falam: “Mais amor por favor”
A cidade grande endurece, o cinza do asfalto entristece, mas
também enriquece, engrandece.
Tem coisa mais dúbia do que os sentimentos provocados por esta cidade?
Cidade do caos, do trânsito sem hora, da garoa intermitente,
do asfalto molhado, dos japoneses, dos italianos, árabes e mulçumanos, de todos,
enfim, paulistanos. Filhos do asfalto.
E a cidade, sem cessar, pede a todos nós: “Mais amor por favor.”
Mais amor,
por favor.
Marília Gabriela Gradin